quinta-feira, 19 de maio de 2011

Violência travestida faz seu trottoir!! (Sobre a Barra do Riacho)
*Tadeu Guerzet - Coordenação Estadual do MTL

"No ar que se respira, nos gestos mais banais
em regras, mandamentos, julgamentos, tribunais
na vitória do mais forte, na derrota dos iguais
A violência travestida faz seu trottoir" (Engenhairos do Hawaii)


Companheiros e companheiras
Este texto não é para resgatar quantitativamente as pessoas, casas, crianças, PMs, dias, feridos, mortos... e o que significou essa operação policial em termos numéricos.
Não se trata, tampouco, de reclamar do que foi "a mais" do que deveria ser feito por parte da polícia. A própria existência da polícia já é uma violência. A questão aqui é denunciar o tamanho da violência não quantificada também.
A violência começou muito cedo na Barra do Riacho.
Meses antes da ação terrorista da polícia, muitas ameaças eram veiculadas pelas mídias de Aracruz. Pessoas eram ameaçadas nas ruas.
No dia anterior, o prefeito cancelou as linhas de ônibus para a Barra do Riacho, as aulas, fechou o posto de saúde e recomendou ao comércio que não abrisse. A sensação nas pessoas era a de que o afeganistão estava sendo preparado para a guerra.
Na noite anterior, um incêndio criminoso numa mata ao lado sufocava as pessoas durante a noite e aumentava a estado de tensão.
Durante a ação, a violência foi cometida com requintes de crueldade. Não apenas pelas balas de borracha e bombas de gás que ardem os olhos e corroem as vias respiratórias. Mas pelos atiradores de elite que ficavam o tempo inteiro mirando nas pessoas com armas de fogo letal. A sensação de estar na mira de uma arma o tempo inteiro por 3:30h é uma violência perturbadora!
O contato com a polícia era humilhante. O tempo inteiro eramos xingados por PMs armados até os dentes. Num determinado momento a GAO de batidas nos moradores e no grupo onde eu estava. Ficamos 30 minutos com os rostos e o corpo sobre o capu de uma viatura da GAO (que estava estacionada no sol forte) com um soldado apontando uma pistola para a gente enquanto outro nos xingava e abria nossas pernas cada vez mais.

Ao final, o que foi isso perto da maior violência. Qual o gesto de violência maior do que você ver sua casa caindo com alguns pertences dentro dela (pois o BME não permitiu que pessoas retirassem as coisas)?

A sensação de não ter para onde ir, e se tivesse.. como levar as poucas coisas que ainda foram tiradas, uma TV, um fogão... O que tirar se você tem 15 minutos? A TV, que é mais cara, ou o colchão, que pode ajudar você a dormir se você precisar se abrigar em alguma escola ou quadra?!?

O que dizer dessa violência em que um pai de família tem 5 minutos para decidir, dentro de seu barraco, o que ele irá levar para ele, a esposa e 2 filhos?

O que fazer quando seu filho te pergunta "onde vamos dormir hoje?" e você não sabe o que responder, ai procura alguém de fora, advogado ou estudante universitário para pedir uma resposta sobre este questionamento simples de seu filho?

E o que dizer a respeito da violência da impotência e da injustiça? Você ver as notícias corrompidas e achar que as pessoas comuns, "guardadas por Deus em suas casas", o "cidadão de bem", irá observar aquela matéria e dizer que o governador está com a razão, ou que foi bem feito tirar "vagabundos que ocuparam uma área que não era deles". Você ser ferido, ter filho ferido, casa derrubada, não ter para onde ir e ainda ser julgado por uma parcela da sociedade como o criminoso que teve o que mereceu. E saber que os bandidos verdadeiros que ocupam os cargos de prefeito e governador do ES, provavelmente serão eleitos novamente na próxima eleição.

Num momento em que o que está em jogo é uma necessidade humana tão básica, e a dureza de um estado que encara essa necessidade como um crime, todos os gestos são uma forma de violência!

A lei é uma violência!

Ser filmado chorando é uma violência. E não ser filmado também!!!

Finalmente, quando chega o conselho de direitos humanos, o povo se encheu de razão por um milésimo de segundos. O BME enviou 3 bombas de gás lacrimogênio na direção do presidente do Conselho de Direitos Humanos. Ai caiu por terra a última esperança de um povo pobre. Ver a única pessoa bem vestida a quem eles tem algum canal de contato ser violentada como eles, mal vestidos. Os soldados do BME responderam ao presidente do conselho de direitos humanos:

"Quer falar com o comando? Ligue para o 190"

O 190 é uma violência! A polícia faz piada com o 190!

Sempre fui convicto, agora muito mais. O BME precisa acabar. A PM precisa ser desmilitarizada.

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