Quem pode mais...
Prefeitura de Aracruz recorre à burocracia para manter 547 famílias sem teto
Editorial
fonte século Diário
28/08/2013 16:51 - Atualizado em 28/08/2013 16:51
No dia 18 de maio de 2011, as imagens do Batalhão de Missões Especiais (BME) retirando com violência cerca de 500 famílias que ocupavam uma área da Prefeitura de Aracruz, em Boa Esperança, distrito de Barra do Riacho, repercutiam na mídia nacional. Os noticiários davam ênfase à ação truculenta da polícia, que resultou na morte de uma pessoa e deixou dezenas de feridos.
Mais de dois anos depois da desocupação, os desabrigados continuam sendo vítimas de violações, já que são expostos diariamente a situações humilhantes e vexatórias na luta por um novo teto. Praticamente todos os meses as famílias são obrigadas a “esmolar” o pagamento do aluguel social à Prefeitura de Aracruz. O aluguel não é um favor do poder público, mas uma das cláusulas previstas no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre prefeitura e desabrigados.
Na última semana, o drama das famílias de Boa Esperança ganhou mais um melancólico capítulo. Os desabrigados ficaram sabendo que a prefeitura havia barrado o projeto do programa “Minha Casa, Minha Vida”, do governo federal, que devolveria um teto às famílias.
A Prefeitura de Aracruz alega que o projeto está em desacordo ao Art 450 do Plano Diretor Municipal (PDM). Segundo o artigo, “(...) os banheiros não poderão comunicar-se diretamente com a cozinha e sala de refeição (...)”.
Ora, uma casa popular do programa tem entre 40 e 50 metros quadrados. Com essa metragem fica difícil cumprir as exigências do PDM de Aracruz. Outra coisa, para quem está morando dois anos em quadras esportivas, de favor em casa de parentes e amigos ou mesmo nas ruas, o detalhe do banheiro perto da cozinha é o que menos importa neste momento.
Inconformada com a intransigência da prefeitura, a Defensoria Pública já entrou como uma ação civil pública com antecipação de tutela para liberar as obras das 547 casas.
Na ação, a Defensoria Pública alega que o projeto de construção das unidades foi exaustivamente analisado pelos setores administrativos da Prefeitura de Aracruz, e aprovado, inclusive, pela Caixa Econômica Federal, financiadora do programa.
Além disso, o TAC estipula que o projeto arquitetônico das unidades deverá atender o que é requerido na Lei Federal 11.797/2009 do Minha Casa, Minha Vida. O que é muito pertinente, caso contrário o programa teria que se adaptar aos PDMs de cada um dos 5.564 municípios brasileiros.
Pesa ainda contra o “rigor” da prefeitura o histórico de “benevolência” do poder público com a Aracruz Celulose (Fibria). A empresa sempre conseguiu todas as licenças municipais possíveis e imagináveis sem precisar fazer esforço.
Um dos casos mais emblemáticos foi a autorização concedida pela prefeitura para a empresa captar água do Rio Doce para suas atividades, pondo em risco a sustentabilidade do rio. Graças à liberação da prefeitura, a Aracruz Celulose passou a consumir cerca de 250 mil metros cúbicos de água por dia. Essa quantidade de água poderia abastecer uma população 2,5 milhões de habitantes.
Esse é apenas um exemplo em meio a diversos outros flagrantes de favorecimento a grandes grupos econômicos, situação que se repete em outros municípios capixabas. De outro lado, quando estão em jogo os interesses dos cidadãos, sobretudo os dos mais desfavorecidos – caso dos sem teto –, a história muda de figura: as facilidades dão lugar à burocracia.
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