terça-feira, 16 de novembro de 2010

NOTIFICAÇÃO RECOMENDATÓRIA



 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE ARACRUZ


NOTIFICAÇÃO RECOMENDATÓRIA  



O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, por seu presentante legal infra-assinado, em pleno exercício de suas atribuições legais junto à 7ª Promotoria Cível de ARACRUZ,

CONSIDERANDO o que prescreve o inciso XXI, do artigo 37 da Constituição da República: “ART. 37, XXI – RESSALVADOS OS CASOS ESPECIFICADOS NA LEGISLAÇÃO, AS OBRAS, SERVIÇOS, COMPRAS E ALIENAÇÕES SERÃO CONTRATADOS MEDIANTE PROCESSO DE LICITAÇÃO PÚBLICA QUE ASSEGURE IGUALDADE DE CONDIÇÕES A TODOS OS CONCORRENTES, COM CLÁUSULAS QUE ESTABELEÇAM OBRIGAÇÕES DE PAGAMENTO, MANTIDAS AS CONDIÇÕES EFETIVAS DA PROPOSTA, NOS TERMOS DA LEI, O QUAL SOMENTE PERMITIRÁ AS EXIGÊNCIAS DE QUALIFICAÇÃO TÉCNICA E ECONÔMICA INDISPENSÁVEIS À GARANTIA DO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES.”

CONSIDERANDO QUE,  no exercício dessa competência constitucional foi editada a Lei 8.666/93, regulamentando o artigo 37, XXI da Constituição da República, restando expressamente prevista a incidência dos comandos normativos desta Lei às licitações e contratos entabulados pelos Poderes Públicos da União, Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (artigo 1º, caput);

CONSIDERANDO QUE o caput do artigo 2º da Lei 8.666/93 expressamente dispõe: “ART. 2º - AS OBRAS, SERVIÇOS, INCLUSIVE DE PUBLICIDADE, COMPRAS, ALIENAÇÕES, CONCESSÕES, PERMISSÕES E LOCAÇÕES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, QUANDO CONTRATADAS COM TERCEIROS, SERÃO NECESSARIAMENTE PRECEDIDAS DE LICITAÇÃO, RESSALVADAS AS HIPÓTESES PREVISTAS NESTA LEI.”

CONSIDERANDO QUE o artigo 17, I da mesma norma estabelece os antecedentes necessários à efetivação da alienação de imóvel público, bem como indica expressamente exceções ao cumprimento dos referidos antecedentes, incluindo nestas uma única hipótese de doação, sendo esta, doação em favor de outra entidade da administração pública.

CONSIDERANDO QUE reza o artigo 17, I, “b” da Lei 8.666/93: “ART. 17 – A ALIENAÇÃO DE BENS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, SUBORDINADA À EXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO DEVIDAMENTE JUSTIFICADO, SERÁ PRECEDIDA DE AVALIAÇÃO E OBEDECERÁ ÀS SEGUINTES NORMAS: I – QUANDO IMÓVEIS, DEPENDERÁ DE AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA PARA ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA E ENTIDADES AUTÁRQUICAS E FUNDACIONAIS E, PARA TODOS, INCLUSIVE AS ENTIDADES PARAESTATAIS, DEPENDERÁ DE AVALIAÇÃO PRÉVIA E DE LICITAÇÃO NA MODALIDADE DE CONCORRÊNCIA, DISPENSADA ESTA NOS SEGUINTES CASOS: B) DOAÇÃO, PERMITIDA EXCLUSIVAMENTE PARA OUTRO ÓRGÃO OU ENTIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, DE QUALQUER ESFERA DE GOVERNO, RESSALVADO O DISPOSTO NAS ALÍNEAS “F” E “H””.


CONSIDERANDO QUE as alíneas “f” e “h” dispõe sobre situações particulares que em nada se confundem com a “doação de imóveis” intentada pelo Município de Aracruz.

CONSIDERANDO QUE a alínea “f” trata de garantia conferida ao cidadão (normalmente de baixa renda) de ver resguardado direito sobre imóvel residencial construído, destinado ou efetivamente utilizado no âmbito de programa habitacional ou de regularização fundiária promovidos pela Administração Pública. Já a alínea “h” indica o resguardo de um direito referente ao exercício de atividade comercial em bem público, desde que se trate de comércio de âmbito local, em área não superior a 250 m2, ressaltando-se que o imóvel deve estar inserido em programa de regularização fundiária desenvolvido pela Administração.

CONSIDERANDO QUE, de todo o texto da norma geral de licitações e contratos, a hipótese que mais se aproxima da prática efetivada pelo demandante, se encontra consignada no § 4º, do referido artigo 17, que assim estabelece: “ART. 17, § 4º - A DOAÇÃO COM ENCARGO SERÁ LICITADA E DE SEU INSTRUMENTO CONSTARÃO OBRIGATORIAMENTE OS ENCARGOS, O PRAZO DE SEU CUMPRIMENTO E CLÁSULA DE REVERSÃO, SOB PENA DE NULIDADE DO ATO, SENDO DISPENSADA A LICITAÇÃO NO CASO DE INTERESSE PÚBLICO DEVIDAMENTE JUSTIFICADO.”


CONSIDERANDO QUE a doação com encargo deve ser precedida de licitação, condicionando-se sua dispensa à existência de interesse público devidamente justificado;

CONSIDERANDO QUE a justificação do interesse público em hipóteses de relativização da regra do prévio procedimento licitatório, depende da expedição de ato administrativo enunciativo, prestante ao detalhamento do interesse público primário;

CONSIDERANDO QUE a ausência de tal formalidade, necessária ao controle da atividade administrativa em tais hipóteses, nulifica a doação com encargo, impedindo que o contrato gratuito produza qualquer efeito.

CONSIDERANDO QUE, em diversos casos de doações feita pelo Município,  não houve prévia licitação, não houve prévia avaliação do imóvel público alienado, inexiste ato administrativo enunciativo justificando o interesse público na alienação, a área doada extrapola em muito aos 250m2 que justificaria a alienação gratuita para fins de comércio local;

CONSIDERANDO QUE a inobservância dos preceitos constitucionais e legais por parte da Administração Pública quando da doação do imóvel em favor de diversas empresas, aponta para a nulidade da doação efetuada pelo Poder Público;

CONSIDERANDO QUE, ainda que se alegue a existência de normas municipais disciplinando as doações de bem público por parte do Município de Aracruz, temos que, no que concerne ao referido tema as normas locais devem guardar simetria com os comandos da norma geral, limitando-se o Legislador Municipal a detalhar a temática de licitações e contratos com o fim de atender às especificidades municipais sem afrontar o sistema erigido a partir da Constituição da República e devidamente veiculado por meio da Lei 8.666/93;

CONSIDERANDO QUE a expressão “cessão gratuita de terrenos” em direito administrativo manifesta vocábulo de conteúdo diversificado, afinal, por meio de tal cessão, normalmente se transfere o uso da propriedade de forma gratuita ou onerosa, sem que se relativize o domínio do Ente Estatal sobre o bem, afinal, particulares podem utilizar de forma exclusiva bem público municipal, sem que o imóvel deixe de compor o acervo da Administração.

RECOMENDA AO SR. PREFEITO MUNICIPAL DE ARACRUZ ADEMAR COUTINHO DEVENS:

1 – SEJAM REVOGADAS, ANULADAS, REINVINDICADAS TODAS AS DOAÇÕES REALIZADAS PELO MUNICÍPIO QUE NÃO ESTEJAM NOS MOLDES ACIMA ELENCADOS.

2 - Em caso de atendimento ou não da presente recomendação, seja comunicada esta Promotoria de Justiça, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados do recebimento desta, sob pena de responder por Ação de Improbidade Administrativa por omissão (art. 11, II, da Lei n. 8429\92).


Aracruz\ES, 30 de SETEMBRO DE 2010.

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