quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Redes de interesses que envolve Rodo Sol e empresas que financiam campanhas, tem como sócio Paulo Hartung e ex- Secretários de governo.

Empresa de consultoria de Hartung e José Teófilo faturou R$ 5,8 milhões em três anos
Ex-governador fez negócios com sócios da Terceira Ponte, beneficiários de incentivos fiscais da era Hartung, além de grandes projetos que estão se instalando no Estado


O ex-governador Paulo Hartung (PMDB) e o ex-secretário estadual da Fazenda José Teófilo de Oliveira montaram uma consultoria com capital simbólico de R$ 5 mil cada, com o objetivo de atender empresas que haviam sido beneficiadas durante sua gestão à frente do governo do Estado. Em três anos, o "escritório de negócios" recebeu quase R$ 6 milhões, oriundos de beneficiários de incentivos fiscais, empreiteiras com extensa ficha de obras públicas e concessões de serviços públicos prestados ao longo dos oito anos em que comandou o Estado.

A consultoria Éconos – Economia Aplicada aos Negócios Ltda, sociedade entre Paulo Hartung e José Teófilo, atuou como uma extensão dos negócios realizados no governo passado. Entre os anos de 2010 e 2013, a empresa batizada como um “escritório de negócios” faturou R$ 5,8 milhões em serviços prestados para grandes projetos, companhias de comércio exterior e beneficiárias de incentivos fiscais no governo passado, de acordo com documentos oficiais da Prefeitura de Vitória obtidos pela reportagem de Século Diário.

Estão listadas todas as notas fiscais emitidas pela Éconos entre janeiro de 2010 e outubro do ano passado. Nesse período, o escritório de negócios emitiu 364 notas por serviços prestados a 66 pessoas jurídicas, entre elas, empresas ligadas a vários ramos de atividade, sindicatos empresariais e até companhias e órgãos ligados à administração pública. Essa lista de clientes revela a íntima ligação entre o escritório de negócios do ex-governador e atos relacionados à sua própria administração.

Aliás, fica difícil diferenciar onde se encerra um e inicia o outro, em função do curto espaço entre a saída dos dois ex-integrantes do governo e o embarque na empresa. Para isso, basta recorrer à própria história da Éconos. Criada pelo ex-secretário José Teófilo em conjunto com a então esposa Márcia Jaccoud Freitas, que é auditora do Tribunal de Contas do Estado (TCE), a empresa só ganhou fôlego após Teófilo deixar a gestão Hartung, em abril de 2008. Ele saiu do cargo para disputar as eleições como candidato a vice-prefeito de Guarapari na chapa do ex-deputado estadual Rodrigo Chamoun, atual conselheiro do TCE.

Apesar de a chapa ter sido derrotada naquele pleito, o ex-secretário da Fazenda não retornou ao governo e passou a se dedicar exclusivamente aos negócios da Éconos. A entrada de Hartung na empresa de consultoria foi consumada somente no dia 5 de abril de 2011 – pouco depois de quatro meses após a descer as escadarias do Palácio Anchieta pela última vez. A “parceria” durou pouco mais de dois anos, até o dia 4 de julho do ano passado, quando o ex-governador se retirou da sociedade de forma inusitada (veja reprodução da alteração no contrato social abaixo).



Na ocasião, Hartung transferiu as suas cotas na empresa, no valor de R$ 3 mil (30% do capital social, estimado em R$ 10 mil), para o ex-secretário, que figura como administrador da Éconos e atual detentor de 80% das cotas do negócio. Em troca, José Teófilo eximiu o antigo sócio de responder por “toda e qualquer responsabilidade por quaisquer fatos ou atos praticados pela Éconos durante todo o período” em que figurou nos quadros da empresa. Chama atenção que a mesma cláusula também exime de responsabilidade por terceiros, hipótese que é vista por juristas como ilegal, uma vez que o contrato é um instrumento particular restrito às partes.

Talvez a preocupação em livrar o ex-governador de qualquer responsabilidade sobre os negócios da Éconos se relacione às atividades desempenhadas pela empresa. Desde a entrada no mercado de consultorias, a empresa de Paulo Hartung atraiu um leque restrito de clientes – sempre ligados a eventos ocorridos no governo passado ou buscando os “aconselhamentos” do ex-governador em negócios futuros. Somente no período de Hartung entre os sócios, a Éconos faturou R$ 4,35 milhões dos R$ 5,83 milhões listados. Os pagamentos eram mensais e, em alguns casos, transcorrem durante todo o período de funcionamento do escritório de negócios.

Nesse período, os principais clientes da empresa do ex-governador foram a empresa TPK Logística, que pagou R$ 720 mil; Sindicato das Empresas do Comércio Exterior do Estado (Sindiex), R$ 613,7 mil; Cisa Trading, R$ 415 mil; Tristão Companhia de Comércio Exterior, R$ 390 mil; VD Comércio de Veículos Ltda (Vitória Diesel, que pertence ao Grupo Águia Branca), R$ 280 mil; Manabi Logística S/A, R$ 275 mil; Itatiaia Móveis S/A, R$ 265 mil; Nutripetro S/A, R$ 264 mil; além da empreiteira A Madeira Indústria e Comércio Ltda, R$ 168 mil.

Muito embora a natureza das atividades dos clientes seja distinta, todos eles guardam uma semelhança: a ligação com negócios realizados ou iniciados durante a gestão de Hartung no governo. Todos os repasses eram feitos mensalmente pelas empresas. Por exemplo, a Cisa Trading realizou 38 pagamentos à consultoria do ex-governador. Na maior parte dos repasses, o valor cobrado era de R$ 10 mil.

Situação semelhante aos pagamentos realizados pela Concessionária Rodovia do Sol (Rodosol), que fez 16 repasses no total de R$ 160 mil, e a empreiteira A Madeira Indústria e Comércio Ltda, de propriedade de Américo Madeira, um dos sócios da Terceira Ponte, que pagou 19 parcelas de R$ 12 mil mensais, totalizando R$ 228 mil.

Outra empresa que fez repasses mensais à Éconos foi a concessionária de energia elétrica EDP Escelsa, que realizou sete pagamentos no valor de R$ 20 mil cada. Chama atenção que o ex-governador chegou a compor, entre maio de 2012 e março deste ano, o Conselheiro de Administração do grupo EDP – que controla a concessionária –, porém, os pagamentos foram registrados anteriormente entre março de 2010 e dezembro de 2011. Desde o início do ano, Hartung também é investigado pelo Ministério Público Estadual (MPES) por suposto beneficiamento da EDP Escelsa na venda de uma área do Estado por um valor abaixo do preço de marcado, no apagar das luzes de 2008.

Ligações perigosas

Esse tipo de ligação entre atos do governo passado e o negócio privado de Hartung após deixar o governo fica clara na análise de seus principais clientes. A primeira empresa da lista, a TPK Logística é responsável pelo projeto do Porto Central, em Presidente Kennedy (litoral sul do Estado). Esse mesmo projeto já teve a digital de pessoas ligadas a Hartung – e da própria Éconos, antes da entrada do peemedebista na sociedade – na transação milionária de compra e venda de terrenos para a instalação do projeto siderúrgico da Ferrous Resources no município.

Hoje, o principal dirigente do Porto Central é o José Maria Vieira Novaes, que divide o capital societário da ZMM Empreendimentos com o irmão, o ex-vereador Marcus Vivacqua. Pelas mãos do peemedebista, a Ferrous recebeu incentivos fiscais para instalar um complexo siderúrgico e portuário. Na mesma época, a empresa contratou a ZMM e a Éconos para fazer a intermediação na compra de terrenos no município. Somente as operações renderam um total de R$ 121,6 milhões às empresas envolvidas no negócio.

Esse não é o único caso onde a relação com os principais escândalos da Era Hartung é direta com as consultorias prestadas por seu escritório. Também figura na lista de clientes a Engenharia e Construtora Araribóia, responsável pelas obras do posto fantasma de Mimoso do Sul. A empreiteira fez sete pagamento à consultoria, totalizando R$ 70 mil. Por conta das obras, o ex-governador e mais sete ex-integrantes de seu governo respondem a uma ação de improbidade administrativa na Justiça por “torrarem cerca de R$ 25 milhões” por obras que não saíram da fase de terraplanagem.

Os episódios dos incentivos fiscais também não poderiam ficar de fora dessa relação. As empresas Tristão Companhia de Comércio Exterior (controladora da Realcafé) e Cisa Trading – que pertence aos grupos Comvix, do empresário Antônio Pargana; e Coimex, de Otacílio Coser – aparecem entre os beneficiários da política no governo passado.

No caso da concessionária Vitória Diesel, pertencente ao grupo Águia Branca, mesmo com a concentração dos negócios do conglomerado na área de transportes, ele atuou na compra de terras para implantação da Companhia Siderúrgica de Ubu (CSU), em Anchieta. Juntas essas três empresas contrataram mais de R$ 1 milhão em serviços da empresa do ex-governador.

Além disso, a Éconos também foi contratada para dar consultoria a empresas que pretendiam instalar projetos no Estado, como a Manabi Logística e a Nutripetro, que pretende construir portos nos municípios de Linhares e Aracruz, ambos no litoral norte capixaba, respectivamente.

Outra empresa de destaque na lista de clientes da Éconos foi a Itatiaia Móveis, que inaugurou uma fábrica de móveis em Sooretama este ano. Os repasses mensais começaram em abril de 2011 e foram até maio do ano seguinte, totalizando R$ 265 mil. Coincidentemente, a consultoria teve início um mês antes do anúncio de formalização do projeto, que recebeu os incentivos do governo estadual – já pela atual administração.

Rede de interesses

A pasta de Desenvolvimento concentra a liberação dos benefícios, bem como atua na interlocução entre o Estado e os setores produtivos, já que em alguns casos, o governo assume o papel de parceiro, facilitando a desapropriação de áreas e até a concessão de licenças ambientais. Esse papel estratégico da pasta vai ao encontro de pagamentos feitos à consultoria de Hartung pela principal entidade do setor de comércio exterior. Ao longo dos três anos, o Sindiex pagou à Éconos um total de R$ 613,7 mil, registrados em 71 notas fiscais.

Na lista de clientes da Éconos figuram outras empresas do setor, como: Cyber Armazéns e Logística S/A, R$ 151,1 mil; Vitcos - Comércio de Cosméticos Ltda, R$ 60 mil; Perfilados Rio Doce, R$ 45,5 mil; Garra Importadora e Logística, R$ 25 mil; Maq Lar Refrigeração, R$ 22 mil; Excim Importação e Exportação, R$ 20 mil; Delalux Logística, Importação e Exportação e Price Importação, Comércio e Exportação Ltda, R$ 15 mil; Log Trading & Supply Chain Ltda, R$ 12 mil; CMPC Celulose Riograndense, R$ 8 mil; e Lodisa Logística e Distribuição S/A, R$ 6 mil.

O setor de comércio exterior não foi o único que recorreu ao escritório de negócios do ex-governador. Vários sindicatos e entidades de empresários aparecem no rol de pagamentos da Éconos: Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Espírito Santo (Setpes), que repassou R$ R$ 148 mil; Sindicato das Empresas de Transporte Metropolitano da Grande Vitória (GV BUS), R$ 50 mil; Sindicato das Indústrias de Rochas Ornamentais (Sindirochas), R$ 30 mil; Associação dos Comerciantes de Material de Construção (Acomac-ES), R$ 15 mil; Associação Empresários da Serra (Ases), R$ 15 mil; Sindicato do Comércio Distribuidor e Atacadista (Sincades), R$ 15 mil; Associação Empresários de Vila Velha (Asevila), R$ 13 mil; Sicoob Credirochas, R$ 12 mil; e Sindicato dos Corretores de Imóveis do Estado, R$ 11,9 mil.

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